Sumak Kawsay: uma
forma alternativa de resistência e mobilização
Para o economista
equatoriano e ex-vice-ministro de Economia do Equador, Pablo Dávalos,
as formas ancestrais de convivência indígenas são formas políticas
de resistência ao capitalismo e à modernidade e alternativas para o
sistema capitalista.
Não apenas um modo de
vida pueril e harmônica entre o ser humano e a natureza: a ética
indígena do Bem Viver, na opinião do economista equatoriano
Pablo Dávalos, é alternativa ao modo capitalista de
produção, distribuição e consumo. É, acima de tudo, parte do
“discurso das resistências e das mobilizações”.
Por isso, o Bem Viver é “uma forma diferente de relação entre a sociedade e a natureza, e a sociedade e suas diferenças”, na qual “a individualidade egoísta deve se submeter a um princípio de responsabilidade social e compromisso ético”, afirma. Nesse contexto, a natureza é reconhecida como parte fundamental da socialidade humana.
Nesse sentido, afirma, “o Sumak Kawsay é a proposta para que a sociedade possa recuperar as condições de sua própria produção e reprodução material e espiritual”, ou seja, “uma nova visão da natureza, sem ignorar os avanços tecnológicos nem os avanços em produtividade, mas sim projetando-os no interior de um novo contrato com a natureza como parte de sua própria dinâmica, como fundamento e condição de possibilidade de sua existência no futuro”. A entrevista que segue foi concedida à IHU On-Line por e-mail.
Confira a entrevista.
IHU On-Line – Quais
são os aspectos centrais da concepção indígena do Sumak Kawsay
(quéchua equatoriano) ou Suma Qamaña (aimará boliviano)?
Pablo Dávalos – A noção de Sumak Kawsay (ou Suma Qamaña, em aimará), faz parte do discurso político dos movimentos indígenas do continente e, como tal, faz parte de seu projeto histórico e político. Essa noção foi recriada a partir de uma confirmação das vivências ancestrais dos povos indígenas e de sua forma de construir sua socialidade e sua relação com a natureza. Na recuperação de suas formas ancestrais de convivência, os povos indígenas encontraram, de um lado, as formas políticas de resistência ao capitalismo e à modernidade e, de outro, as alternativas para esse mesmo sistema capitalista.
Pablo Dávalos – A noção de Sumak Kawsay (ou Suma Qamaña, em aimará), faz parte do discurso político dos movimentos indígenas do continente e, como tal, faz parte de seu projeto histórico e político. Essa noção foi recriada a partir de uma confirmação das vivências ancestrais dos povos indígenas e de sua forma de construir sua socialidade e sua relação com a natureza. Na recuperação de suas formas ancestrais de convivência, os povos indígenas encontraram, de um lado, as formas políticas de resistência ao capitalismo e à modernidade e, de outro, as alternativas para esse mesmo sistema capitalista.
Os movimentos indígenas
têm sido considerados, na academia ocidental e moderna, como parte
dos novos movimentos sociais, com uma agenda nova e suscetível de
ampliar o horizonte dos direitos humanos para os direitos de terceira
geração. No entanto, essa definição de movimentos sociais oculta
o sentido histórico de suas demandas e os converte em mais um
momento do liberalismo. Com efeito, a partir do discurso liberal,
gerou-se a noção do multiculturalismo para processar as demandas
indígenas como propostas particulares, que, em geral, legitimam o
sistema capitalista e o projeto da modernidade ocidental. Para se
diferenciar da etnofagia do multiculturalismo, os movimentos
indígenas propuseram uma forma diferente de contratualidade e de
socialidade.
O Sumak Kawsay propõe, além disso, uma forma de relacionamento diferente entre os seres humanos, na qual a individualidade egoísta deve se submeter a um princípio de responsabilidade social e compromisso ético, e um relacionamento com a natureza no qual esta é reconhecida como uma parte fundamental da socialidade humana. Até agora, é o único discurso e prática coerente que pode deter os desvios predatórios e desumanos da acumulação capitalista, que, no ritmo em que avançam, convertem-se em uma ameaça à vida humana sobre o planeta.
Sumak Kawsay como
desconstrução
É a partir dessa
constatação que é necessário uma desconstrução das ideias
dominantes sobre a economia, o crescimento econômico, a pobreza,
dentre outras. Em primeiro lugar, é necessário demarcar
posições com o Banco Mundial e não utilizar o conceito do
dólar diário, porque a pobreza não é um fenômeno econômico, mas
sim um fenômeno político e que expressa a necessidade do
capitalismo de estabelecer relações de poder e dominação a partir
do controle estratégico da escassez.
Em segundo lugar, é necessário abandonar a ideia do crescimento econômico, porque, stricto sensu, não existe. Isto é, se se contabilizam todos os insumos que são necessários para o crescimento econômico, incluindo os custos externos negativos e os custos de oportunidade, o crescimento econômico sempre será negativo. A produção de um bem ou serviço qualquer que incorpore os custos externos e os custos de oportunidade (para falar na mesma lógica neoclássica agora imperante) tornaria impossíveis os mecanismos de mercado, porque os preços seriam exorbitantes.
Em segundo lugar, é necessário abandonar a ideia do crescimento econômico, porque, stricto sensu, não existe. Isto é, se se contabilizam todos os insumos que são necessários para o crescimento econômico, incluindo os custos externos negativos e os custos de oportunidade, o crescimento econômico sempre será negativo. A produção de um bem ou serviço qualquer que incorpore os custos externos e os custos de oportunidade (para falar na mesma lógica neoclássica agora imperante) tornaria impossíveis os mecanismos de mercado, porque os preços seriam exorbitantes.
Em terceiro lugar, se deveria abandonar a ideia de desenvolvimento, porque implica em violência, imposição, subordinação. Não se pode “desenvolver” ninguém, porque cada sociedade tem sua própria cosmovisão que deve ser respeitada, e, se nessa cosmovisão não existe o desenvolvimento nem o tempo linear, então não se pode desenvolvê-la, pensando que se está fazendo um bem a essa sociedade, quando, na verdade, ela está sendo violentada de forma radical.
1) Que se entende por Bem
viver e qual é sua importância?
2) Segundo o economista
Dávalo que deve ser mudado/desconstruído para que o Bem Viver seja
uma realidade?
3) Qual é a relação do
Bem Viver com a dimensão espiritual da ecologia?
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